O reitor da Unicamp, professor Antonio José de Almeida Meirelles, criticou, nesta quarta-feira (7), de forma contundente, a decisão do governo federal de bloquear recursos da Educação, numa medida que deverá provocar a suspensão do pagamento de aproximadamente 200 mil bolsas da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) – a fundação ligada ao Ministério da Educação que tem como função a expansão e consolidação dos cursos de pós-graduação no país. Na Unicamp, os cortes vão atingir diretamente 2.540 bolsistas – 1.040 no mestrado e 1.500 do doutorado. Serão afetados os contemplados com bolsas de mestrado, doutorado, residência médica e as bolsas de doutorado-sanduíche no exterior (PDSE).
“Isto é, sob todo e qualquer ponto de vista, um equívoco completo”, disse o reitor. “É lamentável que a ciência brasileira, que depende em grande medida de nossos bolsistas de pós-graduação, esteja na iminência de passar por esta situação: a de bolsas não serem pagas”, acrescentou ele.
“Um país do porte do nosso, com uma população tão grande, com tantos recursos e já com desenvolvimento científico e tecnológico tão significativo, não pode ter sua atividade científica e de formação de recursos humanos submetida a essa forma de gestão”, avalia o reitor.
Para ele, esses cortes revelam que há falta de entendimento do papel que a formação de recursos humanos de alta qualidade tem no desenvolvimento do país.
“Somente posso manifestar perplexidade. A dificuldade de acreditar no que está acontecendo aumenta ainda mais quando vemos que isso não se dá apenas com os bolsistas da Capes, mas também com os recursos para as universidades federais”, acrescenta o reitor.
Apagão
“Esta é uma decisão tomada para desestabilizar, neste final de ano, o funcionamento da pós-graduação. Não estamos exatamente surpresos, mas, realmente, estamos muito preocupados”, disse a pró-reitora de pós-graduação da Unicamp, professora Rachel Meneguello.
A pró-reitora disse que entidades e associações ligadas à pós-graduação estão fazendo articulações na tentativa de reverter a medida. De acordo com ela, representantes do Fórum Nacional de Pró-Reitores se deslocaram até Brasília para tratar do assunto diretamente no Ministério da Economia.
Ela disse acreditar na possibilidade de recuo do governo. “É preciso que haja um recuo. Alguns dizem que é muito difícil, já que, segundo as informações, a Capes está com todo o financeiro bloqueado. Todos os pagamentos estão suspensos e não há previsão de liberação, pois depende exclusivamente do Ministério da Economia liberar”, disse a professora. “Ou seja, temos um apagão”, conclui.
Desqualificação
Assessor na Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP), o professor Leonardo Tomazeli Duarte diz que as circunstâncias do momento tornam a situação dramática.
“Recebemos com muita apreensão essa notícia dos cortes. Na verdade, mais um contingenciamento. E há dois aspectos que tornam a situação dramática”, diz o professor.
“O primeiro, é o dia a dia dos estudantes de pós-graduação que, na verdade, são o motor do laboratório de pesquisa. Sem o pessoal da pós não há ciência, não há pesquisa – seja no Brasil ou em qualquer lugar do mundo. Eles é que fazem a pesquisa acontecer”, diz Duarte.
O professor lembra que o valor das bolsas vem sendo reduzido sistematicamente, o que tem levado o pesquisador a uma situação cada vez maior de precarização.
O assessor da PRP diz ainda que os cortes aprofundam o processo de desqualificação da atividade científica. “Isso desprestigia a formação de pós-graduandos e desestimula novos alunos de graduação a tentarem a pós-graduação e serem pesquisadores. E isso é uma coisa igualmente grave”, avalia o professor. “É um erro não valorizar os pesquisadores”, conclui.
O professor Sávio Cavalcante, assessor da Pró-Reitoria de Graduação, lembra que cortes já foram realizados no ano passado com bolsas de licenciatura e que a Unicamp conseguiu reduzir danos com a cobertura por dois meses. “Foi extremamente grave, porque comprometeu a renda de estudantes com alto grau de vulnerabilidade e mostra o descaso do governo”, disse o professor. “Aquele era o tipo de recurso que não poderia ser contingenciado de forma alguma”, acrescentou.
Ele diz ter expectativa de melhora a partir do ano que vem. “As perspectivas é que tenhamos a volta à normalidade em termos de previsibilidade”, afirmou o professor.
Nota conjunta
No início da manhã, as Pró-Reitorias de Pós-Graduação das universidades estaduais paulistas divulgaram nota conjunta para tratar do assunto.
“Este é mais um exemplo que traduz a insustentável situação em que se encontra a educação brasileira, suas condições de financiamento e suas bases de desenvolvimento. Urge que as autoridades vigentes tomem providências para que ocorra a reversão imediata desse quadro, para que o mínimo de normalidade na vida dos bolsistas seja preservado”, diz a nota.
Outros cortes
A decisão do Ministério da Economia ocorre cerca de 10 dias depois de bloqueio de aproximadamente R$ 366 milhões de instituições federais – realizado no dia 28 de novembro.
O corte foi suspenso três dias depois diante da péssima repercussão, mas o bloqueio acabou restabelecido em seguida.
Em 2019, o Ministério da Educação chegou a determinar um contingenciamento de R$ 5,8 bilhões nos recursos destinados às instituições de ensino superior.
Originalmente publica no Portal da Unicamp